DOMINGO RAMOS: A PROCISSÃO DE ESPERANÇA (Mc 14,1 a 15,47)

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DOMINGO RAMOS: A PROCISSÃO DE ESPERANÇA (Mc 14,1 a 15,47)

Frei Jacir de Freitas Faria, OFM[1]

Hoje, Domingo de Ramos! Dia de esperança, apesar das dores que a vida nos reserva. O texto sobre o qual vamos refletir é Mc 14,1 a 15,47. Trata-se de um longo relato de fatos, já conhecidos por nós, os quais antecederam a morte de Jesus na cruz. Quero apresentá-los à luz dos passos de Jesus, na procissão de nossa vida e no espírito de mais uma Semana Santa que se inicia.

Começo com a entrada de Jesus em Jerusalém! Tudo foi muito triunfal. Um jumentinho levando um homem com características de rei. Um povo que gritava: “Hosana ao Filho de Davi!” e jogava ramos de palmeiras para ele passar. Era a trajetória de glória para Jesus. Na missa, quando cantamos “o Senhor é Santo”, fazemos memória desse momento. Jesus é descendente do rei Davi. Maravilha! Ele é o nosso libertador, o Messias, pensava o povo. A palmeira era o símbolo da Lei, da Torá. Jesus está em conformidade com os ensinamentos dos nossos mestres da Lei, pensava o povo. Por isso, a Torá-Palmeira recebe a Torá-Jesus. Tudo ia tão bem! Parecia que Jesus teria um final feliz.

Assim é a nossa história, nesse mundo globalizado, tecnológico, jamais imaginado por um medieval. Parecíamos invencíveis, até o dia da chegada do coronavírus e seus aliados da morte prematura. A vida é assim, cheia de encontros bons e ruins. O segredo é como lidamos com eles. Ninguém pode rejeitar o sofrimento, ele chega sem pedir licença.  

Jesus, até o momento final de sua vida na cruz, teve vários encontros. Ele encontrou-se com uma mulher que derramou perfume caro no seu corpo; com um traidor que se passava por apóstolo e um apóstolo que o traiu antes do canto do galo; com um Simão Cirineu que o ajudou a carregar a pesada cruz; com os seus apóstolos para celebrar uma ceia festiva; com a dor pressentida de morte, no Getsêmani; com o poderoso Pilatos que o interroga e o envia para ser crucificado; com o povo que, diferentemente do dia da entrada em Jerusalém, pede a sua condenação; com a cruz da morte; e, por fim, com a sua mãe, sua tia Maria, sua amada Madalena, sua amiga Salomé e o seu amigo José de Arimateia que lhe oferece, com o seu dinheiro, um enterro digno de rei.    

Nós também, durante a nossa vida, na caminhada de esperança e paixão, nos encontramos no Getsêmani de nossas dores de morte, e também com pessoas que nos oferecem flores de afeto, de ternura, de carinho, assim como as da mulher de Betânia. Quem nunca teve um Cirineu que o ajudou a carregar a cruz? Quem também nunca sofreu a dor de traição de um amigo, de um familiar, de um político? Todos eles são os Judas de nossa história. O melhor é que nunca esqueceremos os encontros, os momentos em que nos reunimos para celebrar a ceia da vida! E é isso o que nos ajuda a amenizar a dor que nos espera na primeira esquina ou, até mesmo, no próprio banquete. São tantos os Pilatos, os que dizem que não têm nada com isso, pois iremos morrer mesmo. São genocidas, ávidos para ditar o rumo de nossa história. Cuidado! Fique atento. Fique em casa.      

Uma certeza eu carrego comigo, que “nesta longa estrada da vida”, música eternizada na voz de Milionário e Zé Rico, “vou correndo e não posso parar”. O meu desejo é o de ser campeão, mas há momentos em que o tempo cerca a minha, a nossa estrada, a vista escure e o fim da vida, da estrada, chega. Parece que não há mais nada para fazer.

Assim aconteceu com Jesus, uma cruz o esperava em Jerusalém! Marcos tinha clareza disso, quando escreveu seu evangelho. Nesse encontro final de Jesus com a cruz, três certezas posso lhe oferecer: 1) As pessoas que o amou em vida estavam ali, aos pés da sua cruz de morte planejada; 2) Um centurião romano proclama que Ele, Jesus, verdadeiramente, era o filho de Deus (Mc 15,39); 3) Na dor da morte, o Deus humanado grita: “Meu Deus, meu Pai, para que me abandonastes?”.

A última cena é terrível. Tudo parece terminado. Não há mais nada para fazer que seguir o caminho de volta para Jerusalém, retomar a procissão da vida e esperar a minha morte. Ledo engano! É aí que renasce a esperança. Em pouco tempo, três dias, Jesus ressuscitaria para devolver a esperança, apesar de tudo e de todos. Deus, o Pai, não o abandonou. Ele está conosco. Ele se permitiu viver a dor humana para nos ensinar que, apesar da dureza da vida, perder a esperança, jamais! Jesus entendeu que no final de sua trajetória na terra, Ele seria acolhido pelo Pai. Uma nova história começaria para Ele e para nós. Que maior mistério de fé e esperança do que isso? Fim! Recomeço!

Sobre o sentido da paixão, morte e o ‘para quê’ de Jesus na cruz, falarei no nosso próximo encontro, na Sexta-feira da Paixão. Ah! Não deixe de dar a sua contribuição para os projetos de vida e de esperança, conforme nos pede a Campanha da Fraternidade desse ano.   Paz e bem a todos e todas!


[1] Doutor em Teologia Bíblica pela FAJE-BH. Mestre em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma. Professor de exegese bíblica. Membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica (ABIB). Sacerdote Franciscano. Autor de dez livros e coautor de quatorze. Últimos livros: O Medo do Inferno e a arte de bem morrer: da devoção apócrifa à Dormição de Maria às irmandades de Nossa Senhora da Boa Morte (Vozes, 2019). Inscreva-se no nosso canal no You Tube: Frei Jacir Bíblia e Apócrifos ou https://www.youtube.com/c/FreiJacirdeFreitasFariaB%C3%ADbliaAp%C3%B3crifos