Maria Madalena 10,1-13: ver para crer

Maria Madalena 10,1-13: ver para crer

 

Frei Jacir de Freitas Faria


      A passagem anterior ao que iremos analisar do Evangelho de Maria Madalena nos mostra que os discípulos estavam aflitos, mas Maria Madalena, com o seu beijo e fala os acalmou. Na continuidade desse fato, Pedro toma a palavra e diz:

1Pedro disse a Maria:2“Irmã, nós sabemos que o Mestre te amou3 diferentemente das outras mulheres.4Diz-nos as palavras que Ele te disse,5 das  quais tu te lembras 6e das quais  nós não tivemos conhecimento...”7Maria lhes disse:8“Aquilo que não vos foi dado escutar,9eu vos anunciarei:10eu tive uma visão do Mestre,11e eu lhe disse:12‘Senhor, eu te vejo hoje13nesta aparição’.

       Pedro, ao falar, representa o cristianismo emergente que começa a institucionalizar-se. Sua fala é carregada de ironia nas expressões: minha irmã; o Mestre te amou mais do que a nós; Ele te revelou coisas que a nós ocultou. Não estaria aí a ironia da instituição? Pedro parece reconhecer o poder do saber de Maria Madalena, visto que ela tinha afinidade com o Mestre.

Maria, ao afirmar que teve uma visão do Mestre, diz que conhece os segredos dele.Esse tema está também presente em Marcos, o famoso “segredo messiânico”. Os discípulos não souberam escutar direito o Mestre e, por isso, não tiveram visão. Ver e escutar são dois verbos que aparecem na fala de Maria Madalena. Escutar está muito ligado ao judaísmo. “Shemá (escuta) ò Israel” faz parte do programa de vida de um judeu. Escutar é o mesmo que interpretar, tornar vivo a Presença de Deus Um. Segundo Dt 6,4-9, a Ele se dever amar de todo o coração (razão e sentimento integrado), com toda a Alma (ser) e com toda a Força (poder aquisitivo). Maria Madalena viu. Ver para crer faz parte do modo de pensar  grego, que os cristãos aderem. Eles vêem o milagre de Jesus e nele crêem. Para os judeus, bastavam ouvir para crer. E nisso residia umas das disputas teológicas entre judeus e cristãos. Ver passa ser para os cristãos a plenitude do ouvir. Maria Madalena representa esse modo de pensar. Não que Pedro e o grupo dos apóstolos representem o lado contrário, mas aqui estamos diante de disputa que visa saber quem mais compreendeu o Mestre. Pedro e os discípulos não foram capazes de escutar. Maria, com a sua fala, anuncia o ensinamento do Mestre. Outra ironia? Maria vê o Mestre em uma aparição e exclama a sua alegria de poder vê-lo. João também registrou a aparição de Jesus a Maria no túmulo. Naquela oportunidade, Ele lhe teria tido: “Não podes mais ficar comigo como antes, pois ainda não subi ao Pai, portanto, vá anuncie aos irmãos que eles também me verão na Galiléia” (Jo 20,17). Qualquer que seja a tradução desse versículo, somos obrigados a reconhecer que talvez nunca saberemos o verdadeiro sentido dessas palavras ditas por Jesus a Maria Madalena. Os estudiosos já propuseram ene interpretações. Todas não muito convincentes. Maria Madalena não poderia tocar no ressuscitado, ser de ordem divina e não terrena. Seria uma explicação plausível. Mas Tomé não foi chamado a tocar no ressuscitado? Ou Tomé, por ser homem, podia tocar em outro homem? Jesus não poderia ser tocado por uma mulher de passado duvidoso. Mas se Maria Madalena não era prostituta, essa explicação não cabe mais. Melhor seria compreender a experiência de Maria Madalena com Jesus na esfera humana e divina. Maria Madalena deve cumprir o seu papel de missionária. Os outros irmãos, por mãos e palavra de mulher, deverão compreender esse mistério. Jesus teria dito a Maria Madalena: “você já viu, compreendeu e creu, vá ajudar aos irmãos fazer o mesmo caminho. E bem-aventurada serás tu eternamente”.